Confiança cega
Uma das coisas que sempre me espantou e encheu de admiração desde que vim para a Dinamarca foi a aparente confiança que as pessoas têm umas nas outras: em muitos lugares mais na província ainda há pessoas que não trancam a porta de casa a não ser que vão de viagem. E o exemplo mais flagrante é talvez o da fruta e vegetais à beira da estrada, um fenómeno que só conheço cá: no Verão se uma pessoa vai dar uma volta pelo campo e passa por uma quinta, é comum que encontre uma banquinha solitária com sacos de vários produtos agrícolas (batatas, couves, cenouras, etc.) e caixinhas de morangos acabados de apanhar e ao lado um cartaz com o preço da mercadoria e uma caixinha onde pôr o dinheiro que se dá pelo que se adquiriu. E apesar de não estar ali ninguém a controlar, as pessoas pagam o que compram. Imagino que em qualquer outro sítio do mundo quem por ali passasse levasse consigo a fruta e o dinheiro e talvez até a banquinha...
Ora bem, este fenómeno pelos vistos foi cientificamente comprovado: um grupo de cientistas acabou de demonstrar que em comparação com outras nações, os dinamarqueses têm muita confiança uns nos outros e nas outras pessoas em geral, incluindo no sistema legal, na polícia e até no governo, imaginem lá. Isto possivelmente porque desde os primórdios da nação, no tempo dos vikings, não haviam contratos escritos e uma pessoas tinha de confiar nos acordos que se faziam oralmente – dar a sua palavra bastava. Para além disso nos países com uma segurança social bem desenvolvida, a confiança parece ter boas condições para se desenvolver – não que ninguém engane ou vigarize ninguém, mas não há tanto essa necessidade, porque quase todos estão relativamente assegurados social e economicamente.
É bom, não é?
14 Comments:
fantástico! também ouvi uma história de um português que trabalhava numa empresa (julgo que na suécia) e que perguntou aos colegas que chegavam mais cedo ao escritório por que razão estacionavam mais longe da porta. eles responderam que o faziam porque tinham tempo, ao passo que os que chegavam mais tarde, vindo mais em cima da hora, dava-lhes mais jeito encontrar os lugares perto da porta vagos. incrível!
Wow! Aí está um exemplo exímio e único de civilização e consideração pelo próximo. Não posso deixar de imaginar como seria, se essa mentalidade contagiasse...
era bom, não era? imagine all the people...
Imagine... :-)
Uma vez perguntaram-me porque é que eu, mal chego ao trabalho, vou a correr beber os três litros de café que estão já feitos para o pessoal ir bebendo ao longo do dia. Pensavam que eu era um viciado egoísta. Naturalmente que expliquei que prejudicava a minha saúde com tal dose quase letal de cafeína apenas para salvaguardar a saúde dos meus colegas de trabalho.
Cenas semelhantes tiveram lugar com os bolinhos para acompanhar o café, com os cheques dos ordenados e com a mulher do patrão.
Vida de Praia, se na Dinamarca é que se está bem, porque é que não há aí tubarões? Porque é que a Mademoiselle Tautou não é dinamarquesa? Porque é que o meu blogue não está escrito em dinamarquês? Porque é que o Cristiano Ronaldo não joga na Dinamarca? (Espera, retiro esta última.) Ah, agora ficaste sem resposta, foi, foi, foooiii? É mesmo dinamarquesa... :-)
"Não posso deixar de imaginar como seria, se essa mentalidade contagiasse..."
Se contagiasse, havia sempre um gajo que era imune ao contágio e ajudava a fazer reset à conta bancária do pessoal. Aqui o je já encomendou a vacina pela Internet. Parece que mete à mistura urina de escorpião...! Acho que deitei fora 109,89€ + custos de envio...
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Adivinhaste: fiquei sem fala - e claramente sem resposta. Admiro porém esse teu altruismo. Os teus colegas hão-de agradecer-te um dia... o patrão é que suponho que não :-P
E tens razão: a Dinamarca seria muito, mas MUUUUITO melhor, se o Cristiano Ronaldo cá jogasse :-D
109,89€ é um balúrdio, pá. E tu caiste nessa?... Não te estou a reconhecer... ;-)
Bem, isto aqui em Portugal... Quem chega a horas ao enprego estaciona nos lugares mais próximos e os que chegam atrasados em segunda (ou terceira...) fila. Portas sempre fechadinhas, não vás sair do emprego e nem lá teres sequer o lugar do carro - ocupado obviamente por alguém que chegou entretanto.
Quanto à coisa insólita da barraquinha da fruta, aqui o mais certo era não haver barraquinha, nem fruta, nem caixa nem rigorosamente nada!!
Por acaso a clínica onde trabalho também tem sempre a porta aberta - e sem vigilância. Nem vou comentar esse facto! :D Qualquer dia ficamos lá com as paredes - se ficarmos!
Fiquei encantada!
Acho que vou emigrar para aí...
Foi por vir de um sítio assim que me custou a crer que alguém pudesse ser tão confiante. Lembro-me a princípio de ter perguntado várias vezes aos meus sogros, se não iam trancar a porta para a noite; creio que não perceberam bem a questão :-) (entretanto começaram a trancar a porta à noite - mas ainda não de dia - quando um tipo pacífico mas caído de bêbado lhes entrou em casa numa noite de fim de ano, estanto eles já deitados, porque queria qualquer coisa com que brindar e um charuto).
Há quanto tempo é que existe a clínica onde trabalhas?... Por enquanto parece estar a resultar esse sistema de porta aberta...
’bora, alecrim ;-)
Não tens mais uma casa por aí?
Estou farto deste país!!
beijo
Como te compreendo, graça. Mas infelizmente casa só tenho uma.
Um abraço.
A clínica já tem praí uns 3 anos... E tem computador... e impressora... logo na parte externa :|
Ora aí está um exemplo de plena confiança nos utentes e nos demais, portanto... ;-)
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