Há varandas e há marquises
Adoro a minha varanda! Não é muito grande mas o suficientemente ampla e é de momento o meu favorito espaço de lazer em toda a casa. É aqui que leio, escrevo, matuto sobre a vida, adormeço, vejo o pôr do sol. Tomo aqui o pequeno almoço ao Domingo. Apanho sol, descanso, bebo ice tea, espanto as gaivotas madrugadoras entre Abril e Outubro. Só aqui tenho duas roseiras, um vaso de ervas aromáticas e um de margaridas. E duas indispensáveis esperquiçadeiras. De Verão também cá seco a roupa e de Inverno contemplo a neve que uma vez ou outra aqui se amontoa, cobrindo os vasos por completo.
Na Dinamarca não é muito habitual ter varanda e quem as tem desfruta-as ao máximo: o churrasco faz horas extraordinárias, fazem-se almoços, jantares (casamentos e batizados, que saiba, ainda não), bebe-se cerveja e rosé fresquinho e conversa-se até às tantas, também com os vizinhos nas suas varandas a jantar e a conversar.
Quando eu era miúda também tinhamos varanda. Gostava de lá brincar, fazer tendas com os cobertores e, nos meus momentos mais marotos, molhar os transiuntes sem ser vista. Vieram os anos oitenta e tornou-se moderno fechar as varandas, envidraça-las, torná-las nas ditas marquises. Os meus pais seguiram a tendência e a ex-varanda actualmente marquise foi-se enchendo de coisas e móveis e a enorme gaiola dos piriquitos e foi-se transformando numa segunda arrecadação com espaço ínfimo para brincadeiras.
Como desfruto tanto da minha varanda hoje acho cada vez mais difícil compreender a razão de ser da marquise portuguesa. Será para proteger do sol? Para esse efeito bastaria certamente um chapéu de sol. Para ganhar mais uma assoalhada para acolher a família já grande no tempo em que o planeamento familiar era tão comum como i lince da Malcata? Ou talvez para não destoar do vizinho que ainda hoje não sabe ao certo porque deixou a marquise substituir a varanda? Só sei que a moda pegou de tal maneira, que muitas casas novas em Portugal hoje em dia são tão práticas que até já vêm com marquise.
6 Comments:
acho que as marquises proliferam nos prédios para condizer com os muros prolongados por chapas de metal à volta das moradias com jardins de retalhos de pedra mármore e fontes de cimento ao meio. os portugueses têm a capacidade de usar o que têm de melhor e transformá-lo em gaiolas hediondas de que nem sequer usufruem. é triste.
Como ouvi dizer há pouco tempo, quem não tem dinheiro para comprar casa nova, fecha a varanda! Em muitos casos, penso que é mesmo uma questão de arranjar mais uma assoalhada de emergência. Lembro-me de, nos anos 80, ter amigas cujos pais marquisaram as varandas para terem um quarto onde acomodar o filho, que já era grandinho de mais para partilhar o quarto com a irmã. Hoje em dia, vejo muitas marquises que são "escritórios": há sempre uma estante foleira com muitos arquivadores. Mas eu, felizmente, tenho a sorte de ter comprado uma casa com varanda a sério e de não precisar de a fechar. E também defruto dela ao máximo, como tu. Gostei muito de saber que temos essa "vivência" em comum. :D
era desfruto, claro... :(
Papel químico e tikka: gostei muito dos vossos comentários apurados, fizeram-me rir e quase também chorar!
Engraçado termos essa vivência de varanda em comum as três, por se compatibilizar tão pouco com a mentalidade portuguesa, em que a marquise é um mal tão comum que até há verbo para isso: marquisar : /
Hoje foi mais um dia óptimo para estar na varanda! : )
Olha, eu acho que inventei esse verbo. Pelo menos nunca ouvi ninguém usá-lo! No entanto, já deve constar desse maravilhoso dicionário que ofereceram ao teu marido... :D
E se não tivesses inventado, com a prepotência das marquises em Portugal, alguém mais inventaria : )
Nem me atrevo a consultar o "dicionário"...não me admirava nada se lá encontrasse esse "novo" verbo, até com "gralhas" e tudo.
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