quinta-feira, agosto 31, 2006


Obras públicas ad eternum
Não há nada mais desconcertante, irritante até, do que as obras públicas da praxe; por exemplo numa estrada ou auto-estrada em obras: quilómetros e quilómetros de faixas condicionadas ao trânsito, que lentamente se arrasta, meio metro de cada vez. Aquele pára arranca, pára arranca que não parece levar a lado nenhum, a paisagem é precisamente a mesma que há vinte minutos atrás. Será que em vez de seguir para a frente na realidade e por qualquer descuido afinal fiz marcha atrás? O constante pé no travão e o olhar alerta, não vá eu por percalço ou distracção bater no da frente que parecia avançar, mas afinal também não sai do sítio. Velocidade condicionada. E já repararam que 90% das vezes as obras estão completamente desertas? Onde estão os homens de capacete e colete fluorescente à hora em que vou para o trabalho? E à hora em que volto? Às vezes tenho a sensação de que cavaram um buraco sem fundo e se puseram na alheta, até alguém um belo dia se admirar da sua ausência sistemática. Não admira que durem tanto tempo, que não aparentem progredir, parecendo por vezes inspiradas na “História Interminável”.
Outra coisa simplesmente impressionante é a total falta de coordenação nestas coisas: é necessário pôr cabos telefónicos subterrâneos; fecha-se uma faixa, abre-se um buraco de meio quilómetro, enterram-se eventualmente os cabos, tapa-se o buraco, alcatroa-se. Três meses mais tarde alguém se lembra de que já está mais do que na hora de mudar as condutas de gaz já antigas – precisamente no mesmo sítio! – volta a abrir-se um buraco, mudam-se as condutas do gaz, um processo que pode demorar meses a fio, tapa-se o buraco, alcatroa-se novamente. E daí a quinze dias é a vez de se instalarem fibras ópticas, ou de alargar a estrada e aumentar o número de faixas exactamente no mesmo sítio e lá vem mais buraco, mais lentidão, mais letargia durante o próximo ano.
Adivinharam: daqui a pouco vou sair para o trabalho e pela milésima vez vou passar por uma obra pública que já atravanca o trânsito à meses sem apresentar qualquer sinal visível de progresso.

quarta-feira, agosto 30, 2006

Baile até às tantas
Sábado fomos a uma festa de anos de um casal amigo. O jantar foi bom, as conversas animadas, os anfitriões estavam de óptimo humor. Mas a melhor parte foi quando apartir da meia noite e tal se pôs música para o pessoal dar um pé de dança. Se há quem perca a sensação da gravidade, do peso próprio, e quase levite numa piscina, eu perco-a no chão de dança com a música, o ritmo a envolver-me completamente. O disk jockey, também ele filho dos anos 70 e 80, foi particularmente feliz na escolha do cardápio musical: começou pelo ”Billy Jean” do Michael Jackson, não dispensou o “99 red balloons” da Nena, passando pelo “Kids of America” da Kim Wilde, tema de muito antes desta sonhar com programas de jardinagem, e pela banda sonora do “Grease”. Número após número que me transportaram, elevaram, deram energia aos pés e asas ao coração. Vibrei, pulei, dancei durante horas. Nem dei por ficar com os pés doridos, nem por se criar uma bolha enorme na sola do pé. Por mim tinha dançado até ao nascer do sol. Como é bom esquecer-se, esquecer tudo e deixar-se levar pela música do momento!...

terça-feira, agosto 29, 2006


Vida de leão
Desde miúda que me lembro de no Verão haver campanhas televisivas para tentar prevenir ao máximo o abandono de animais domésticos nas ruas durante as férias. E apesar de nunca ter tido animais de estimação, sempre me confundiu, sensibilizou, perturbou e chocou este fenómeno cruel e irresponsável da sociedade portuguesa: primeiro compras um cão, tratas de o vacinar e alimentar durante meses e meses, crias uma relação, afeiçoas-te a ele e ele a ti. E de repente chega Agosto e dás-te conta de que vais para férias e não te apetece levar o cão, ou não te deixam ter o cão para onde vais passá-las. E o que fazer então? Pensão para cães está fora de questão, porque achas caro demais e todos os amigos e vizinhos vão de férias na mesma altura, ou já foram e não deixaram contacto. Só resta abandoná-lo na rua (?) Como é possível cometer tal crime, deixar um bicho dependente à deriva, à sua sorte, ao deus dará? Entretanto li há dias que no Brasil esta situação se tornou, se possível, ainda pior: devido a uma nova lei que proíbe a exibição de felinos e outras feras selvagens nos circos, estes não foram de meias medidas e soltaram os leões que tinham em cativeiro. Para as ruas! Resultado: 68 leões à solta nas ruas, magros, escanzelados, em péssimo estado, a morrer de fome de tão desabituados de caçar o seu próprio sustento – isto para a sorte do transiunte brasileiro; senão teria sido carnificina total. No Brasil leão tem vida de cão!
E da maneira como a vida está, quem diz que no futuro quem quer aproveitar as férias e não ter chatices, para além dos cães não começa também a abandonar os filhos ou os pais idosos na rua? Há quem diga que o homem é um animal racional... hmmm, talvez.., mas por vezes é de certezinha um animal de hábitos bárbaros, sem coração, sem piedade, sem compaixão...

segunda-feira, agosto 28, 2006

Reflexos
Som? Câmara? Acção! Há dias ao pequeno almoço demorado de Sábado o meu marido comeu um bolo com açucar caramelizado no prato que tinha à frente. Depois dele comido, o prato já não estava em condições para receber o pão, por isso foi trocado. E voltou a sê-lo, porque entretanto distraiu-se e pôs umas colheradas fartas de iogurte natural no prato destinado ao pão.
Situações como esta sucedem-se de quando em vez, quando perdemos o controle consciente e automaticamente perpetramos acções distraídas. É como ser-se sonâmbulo de olhos abertos, conscientemente inconscientes. Quantas vezes sem pensar abandono as chaves, os óculos de sol, um livro num sítio qualquer ao acaso para mais tarde não os encontrar e depois de uma busca exaustiva ir dar com eles nos sítios mais estranhos? Ou me dirijo ao caixote do lixo com a roupa para lavar?
Acções reflexas são essenciais por exemplo quando se respira ou se anda de bicicleta. Seria bem mais complicado pensar em cada inspiração e expiração, em cada pedalada, no que se está a fazer, na coordenação dos movimentos. Mas há vezes que são chatas, transtornando-me a vida.

domingo, agosto 27, 2006

1º aniversário
Era uma vez um blog que viu a luz do dia há precisamente um mês atrás. Fez muita vida de praia, mas não só. Já deambulou pelas canções da minha infância e pelos meus hábitos ainda presentes de adolescente, foi às compras, acordou estremunhado de madrugada, batalhou com um dicionário assassino, jantou fora, esteve na varanda enquanto ainda não chovia, andou em introspecção, registou o início de uma dieta ainda activa (há três quilos atrás) e até já deu um passeio pelo jardim zoológico.
Nasceu do desafio de uma amiga, também ela bloguista valente, nas férias – “claro que consegues escrever textos com pés e cabeça, basta começares – e não vais é conseguir parar outra vez”. Como sempre, ela tinha razão: e ... vupti ... de um dia para o outro estava em órbita na blogosfera e tinha arranjado um vício que me prende ao monitor e a inúmeros papeis e papelinhos (guardanapos de papel, contas de supermercado, o que quer que tenha à mão quando me dá a inspiração súbita) várias vezes por dia, para desespero dos que me rodeiam.
Tem sido divertido dar mais atenção a e magnificar os pequenos detalhes e pensamentos do dia a dia; e mais divertido ainda trocar impressões com alguns dos visitantes assíduos a este blog. Voltem sempre!

sábado, agosto 26, 2006

Zoófila
Uma análise rápida mostra que há dois tipos de adultos que frequentam os jardins zoológicos: professores de biologia e pais de filhos. (“Então e avós?”) Ok, e avós de netos. Eu também sempre delirei com as idas ao zoo. Mas não pertencendo a nenhuma destas categorias, não querendo ser apelidada de infantil nem querendo ter de pedir emprestado um sobrinho, cada vez que me apetece ir dar uma volta ao jardim zoológico sinto que tenho de arranjar um alibi para não destoar: se alguém inquirisse a razão da minha presença diria-me zoófila, uma amante da natureza e da fauna em particular. A verdade, porém, é que lá vou porque mantive o meu fascínio de miúda; em relação ao zoo sou infantil mesmo (mas só em relação ao zoo, não fiquem vocês com uma ideia errada a meu respeito!...)
O jardim zoológico de Lisboa em Sete Rios continua a ser o meu favorito. Conheço-o praticamente de cor. Manteve o estilo clássico apesar de tentar seguir os tempos e vontades e já ter havido bastantes renovações. E tem hipopótamos!
O jardim zoológico de Copenhaga também vale a pena visitar. É moderno, os animais têm condições relativamente humanas e é ajardinado. Costumo começar pelos gibões que vivem numa ilha num navio semiaberto e adoram balançar-se nas cordas que ligam a sua modesta habitação às árvores de que fazem trapézio. Passa-se pelos pelicanos de papo cheio, pelos mochos e corujas com ar de quem dormita, pelos flamingos cor de crustáceos, que segundo dizem são a sua alimentação essencial. Pelos macacos de todos os géneros e feitios. Virando à esquerda vai-se dar de um lado com as focas sempre contentes a bater palmas, e do outro com os ursos – os polares, os castanhos que têm crias brincalhonas, os negros de colar. Não tarda muito passamos pelo casarão dos elefantes. Os pinguins parecem sempre prontos para festa de gala, mas na realidade preferem um bom mergulho na água gélida. Adoro passar pelas jaulas dos leopardos e dos tigres, cujas crias adoram brincar às caças com uma pele de coelho que puxam ferozmente entre si.
Mas a parte que mais me atrai é a zona tropical – dispenso os bicharocos repugnantes do fundo da floresta (as baratas, centopeias e aranhas gigantescas por exemplo), o mesmo se pode dizer das cobres e serpentes. Os camaleões são giros, mas normalmente tentam esconder-se. As borboletas dançam animadamente pelo ar ou pousam ao de leve nos hibiscos. Mas o que eu verdadeiramente vim para ver são o micos-leões dourados da Amazónia (leonthopitecus rosalia). São macaquinhos minúsculos de pelo alaranjado. Perdi para eles o meu coração em Lisboa, quando um enfiou o braço por entre as grades e me apertou o dedo. Pulam de galho em galho, brincam com a fruta e parecem derretidos com tanta atenção. Por mim ficava ali o resto do dia, mas o meu marido lembra-me gozão de que ainda há mais para ver: os papagaios, os papa-formigas, o covil dos leões, as girafas de pescoço alçado e cabeça nas nuvens, os antílopes e impalas, as zebras, as avestruzes, os cangurus, as tartarugas das Galápagos, os lemures, os lamas, os rinocerontes, os camelos (ou serão dromedários? Nunca me lembro de qual é a diferença), até burros lá há. Mais de 3300 animais de 270 espécies. Um dia bem passado, que merece ser repetido em breve, estava a chegar ao fim. Foi então que me apercebi de que ainda não tinhamos visto os obrigatórios hipopótamos. Démos voltas e mais voltas – certamente um jardim zoológico que se preze tem hipopótamos? O de Copenhaga, por estranho que pareça, não tem nem um!

sexta-feira, agosto 25, 2006

Bate leve, levemente como quem chama por mim – será chuva?
O tempo é um fenómeno estranho pelo imprevisível que é. Na teoria percebo os mecanismos que o movem e transtornam – altas e baixas pressões, frontes de ar quente e frio, ciclones e anticiclones (como o dito dos Açores, que é sempre uma chatice), água que se evapora, que sobe e se condensa. Mas na prática continua a ser um mistério tão grande quanto qualquer um dos grandes mistérios do mundo, como o que causa os gigantescos círculos nos campos de trigo, ou em que estariam suspensos os famosos jardins suspensos da Babilónia.
Este tem por exemplo sido um Verão de extremos onde vivo. Se Julho foi espectacularmente quente e se bateram recordes em termos de calor, já Agosto tem sido de certeza o mês mais chuvoso de sempre (ou assim parece) com mais de 120 mm de pluviosidade numa questão de 24 horas, em certas partes do país, e somente 3-4 dias em que não se viu uma gota de água e o tempo que fazia à noite era o mesmo que estava quando me levantara de manhã. Em termos de variedade tem sido largo o repertório: chuvas torrenciais durante horas a fio, rápidos aguaceiros tipo blitz, chuva grossa, média, miudinha, chuviscos, chuva vertical e chuva perpendicular e quase horizontal batida pelo vento. Chuva calma e chuva feroz e violenta, trovoada.
Em circunstâncias normais costumo achar acolhedor estar num cantinho abrigado da casa debaixo de um cobertor a ver a chuva, com uma chávena de chá bem quente e um livro e a ouvir o seu ruído a bater ao de leve nas janelas. Mas como me revolta e entristece admitir que é óbvio que nos aproximamos precocemente e a passos largos do Outono e que a vida estival de praia já lá vai, adeus e até para o ano, só me apetece olhar para as nuvens e gritar: “alguém se esqueceu novamente de fechar o chuveiro, pá!”
A única vantagem é que voltei a ter a praia só para mim.

quinta-feira, agosto 24, 2006

Planos de fim de semana
De Sexta a oito dias vou alimentar um dos meus maiores vícios e mal posso esperar! É que a Selecção das Quinas vem cá fazer um jogo amigável de preparação frente à selecção dinamarquesa. Já tenho bilhetes, é claro, e vou a este grande encontro futebolístico na companhia do meu marido e de um casal amigo também luso-dinamarquês. Sabia que era anteontem a conferência de imprensa em que seria divulgada a lista de convocados e fui logo ver ao site da Federação Portuguesa de Futebol quem seriam afinal os 22 sortudos e ilustres jogadores convocados pelo seleccionador nacional, o mister Luiz Felipe Scolari, para o jogo a realizar dia 1. Não os conheço a todos. Mas felizmente parecem poucas as surpresas. O plantel é praticamente o do Mundial recentemente disputado – com as tristes ausências do Figo, que se reformou mesmo de vez da selecção, e do Maniche que por razões desconhecidas nem sequer foi convocado desta vez (os seus "petardos" desde o meio campo deixarão saudades); e, diriam talvez as más línguas, a menos triste ausência do Pauleta que seguiu pelo mesmo caminho do capitão de equipa e não vai deixar saudades.
Aqui fica a lista completa de convocados (tirada do site da FPF):

Costinha (Atlético Madrid);
Paulo Ferreira (Chelsea FC);
Ricardo Carvalho (também do Chelsea – o Mourinho vai ver-se aflito sem os seus dois portugas durante mais de uma semana);
Nuno Valente (Everton FC);
Deco (FC Barcelona);
Hélder Postiga (FC Porto);
Ricardo Costa (outro do FC Porto);
Ricardo Quaresma (o terceiro a vir da cidade “imbicta”);
Boa Morte (Fulham FC – o nome é macabro, mas o homem sabe o que faz num relvado!);
Cristiano Ronaldo (Manchester United FC);
Tiago (Olympique Lyonnais – espero que não se veja “às aranhas” como no Mundial: "a bola? Mas onde está a bola?");
Nuno Gomes (SL Benfica);
Petit (também do SL Benfica – espero que se controle e não dê porrada a torto e direito);
Simão (SL Benfica – com a sua excelente postura);
Ricardo Rocha (SL Benfica);
Quim (SL Benfica);
Caneira (Sporting CP);
Carlos Martins (Sporting CP);
João Moutinho (Sporting CP);
Ricardo (Sporting CP - o grande Ricardo!);
Hugo Almeida (SV Werder Bremen);
Fernando Meira (VFB Stuttgart).

Notaram porventura quem foi incluido na lista de convocados? O CRISTIANO RONALDO – iupiiiiiiiiiiiiiiiiii!!! : ) Ou pensavam que o vício a que me referia era ir assistir a jogos de futebol? Este até vai ser o meu primeiro e será de certeza inesquecível! Lá estarei com uma das minhas camisolas 17 e uma bandeira verde e rubro enorme a torcer por Portugal. Por-tu-gal! Por-tu-gal! Por-tu-gal!
Já entrei em contagem decrescente para a grande noite.

quarta-feira, agosto 23, 2006




Hospitais privados
Qual é afinal a atracção dos hospitais privados? Para além dos quartos agradáveis e amplos decorados com bom gosto e com vista para o mar, um pessoal de primeira e não terem listas de espera? Descobri há dias que é o que têm no menu. Senão vejam esta descrição: “Na mesa de cabeceira dos pacientes está um menu, porque no Hospital Privado X não se servem legumes tão cozidos que se tornaram desenchabidos nem bifes duros como solas de sapato com molho que não sabe a nada como na tradicional cozinha de hospital (quem já esteve internado que o diga...). O almoço encomenda-se da charcutaria e há escolha livre entre sandes de luxo, salada de macarrão, ciabatta e muito mais. O jantar vem de um restaurante e do menu pode-se por exemplo escolher um creme de peixe ou fois gras com balsamico como entrada, seguido de bife de vitela com molho de estragão e para acabar queijos ou uma fragilité de côco com creme de chocolate e mel de acácia. A refeição poderá é óbvio ser acompanhada de vinho branco ou tinto” (citado do jornal 24 Horas). Estão a ver? Manjares suberbos em vez do comida sem graça que é a sina dos hospitais estaduais.
Um dos hospitais estaduais de Copenhaga já fez a experiência: menus individualizados a la carte. E há quem diga que foi tão bem sucedida que há um plano de fazer disso a norma. Se pegar, já tenho outras propostas: manicures, massagem, jacuzzis, pedicures, tratamentos de beleza ao rosto, roupa hospitalar das melhores marcas, etc, etc. Tantos luxos só podem fazer bem à saúde.

terça-feira, agosto 22, 2006

Diplomacia e falta dela
As coisas podem dizer-se das mais variadas maneiras: diplomaticamente, com ironia, de uma forma humorística, ou impertinente, ou mesmo à bruta. Considero-me uma pessoa bastante diplomática, não me agrada ter de ferir as susceptibilidades de alguém. Posso usar o humor, mas tento fazê-lo com gentileza. E sinto-me bem com quem dá as suas opiniões desta mesma maneira. Como há dias em que ia a conduzir atrás de uma carrinha branca bem sujinha. Quem não viu já aqueles comentários despropositados escritos a dedo num carro naquele estado? "Lava-me porco!" Quem deixou o seu comentário desta vez é cá dos meus; escreveu simplesmente: "este modelo também há em branco".
Esta minha aversão à franqueza total e descarada deve ser fruto de ser filha da minha mãe. Quem a conhece, sabe que não domina propriamente a arte da diplomacia e se acha no direito de dizer o que pensa, sem filtro. No ano passado recebeu uns brincos do namorado da minha irmã e não engraçou com eles. Em vez de agradecer a atenção do rapaz, ou no máximo acrescentar que a côr normalmente não lhe fica muito bem, ou que não tem roupa a condizer, ou coisa do género, disse-lhe espontaneamente na cara: "estes brincos tão feios como a noite dos trovões".
Os gostos são diferentes. Nem sempre é fácil ser-se diplomático, fazer críticas construtivas, mas vale a pena tentar.
Da próxima vez que fizer uma crítica vou tentar lembrar-me da carrinha branco-sujo.

segunda-feira, agosto 21, 2006


Precisas de um hobby?
Esquece a filatelia, a fotografia, o desenho, a leitura, escrever poesia, a apicultura e até a criação de capoeira. São hobbies que já passaram de moda como o macramé e bordados em ponto de cruz. Num jornal local li há dias sobre um hobby sem precedentes, o hobby do futuro: na internet há pelos vistos um site em que se lá puseres uma foto tua, numa questão de segundos ficas a saber com que membro do jet set internacional te pareces mais. Bono Vox? John Travolta? Luis Figo talvez? E a parte gira é então vestir-se como a tal estrela e ir a concursos com outros look alikes, tentar imitar a Madonna. Ou por exemplo o Elvis Presley.
Nunca me achei parecida com ninguém conhecido, nem acho que nenhuma das minhas amigas é a cara chapada da Michelle Pfeiffer nem da Natalia Imbruglia (sorry, girls...). E felizmente também ainda não conheço ninguém que tenha o novo hobby em questão. Nem saberia como reagir se um dia me dissesse: “Olha, arranjei este hobby muita giro.... Já tinhas por acaso notado que eu sou igualzinha à Posh Spice?” Francamente a minha imaginação é limitada demais para conceber o gozo que dará mascarar-se de outrém só porque se pode.
Quando uma pessoa pensa que já viu tudo, como regra geral ainda só viu pouco ou nada.
Não admira que tanta gente ainda acredite que o "Rei", Elvis, ainda vive e está bem de saúde... com tantos sósias por aí à solta...

domingo, agosto 20, 2006

Andorinhas
Ontem ao cair da tarde fomos a uma das nossas praias favoritas na ilha onde vivemos; é numa zona natural visitada por muita passarada migrante, especialmente andorinhas. E ontem estava apinhada delas. Quando as vejo invejo-lhes a audácia, a rapidez, as manobras imprevisíveis, a ligeireza confiante de movimentos, a maneira pitoresca como pairam nas alturas e quase tocam as nuvens e agilmente voam a pique rente à água que raspam ao de leve, ou rente aos telhados e às paredes das casas, entram, saem, voltam a entrar, brincam frivolamente, desafiam-se mutuamente em corridas aéreas desenfreadas. Porque a sua natureza o dita constroem os ninhos nos alpendres e beirais que querem, sem limites, sem demarcações, sem fronteiras. Sobrevoam praias e planícies. Comem no ar, só pousam para descansar as asas fatigadas de tanto esvoaçar e providenciar para as crias que de si dependem. Criam os filhos e voltam a partir, vão ver o mundo, terras mais quentes. Seguem o sol, migram de estação em estação, aproveitando os ventos ao longo das zonas costeiras. Sem comprar bilhete ou mostrar identificação. Isso é que deve ser vida!
Se não fosse a chatice de ter de me alimentar de insectos repelentes e de ter de voltar a regurgitá-los, até gostava de ser andorinha.

sábado, agosto 19, 2006

Foto: Scanpix
É do arco da velha – ou da nova
Li há dias num jornal relativamente sério que o ilusionista e prestidigitador David Copperfield, conhecido por num ápice conseguir fazer desaparecer tigres ferozes e aviões gigantescos à frente das câmaras e do público ao vivo, agora descobriu a famosa fonte da juventude, quimera de tantos exploradores e fantastas durante séculos. É nas Bahamas. Mas não pensem que podem apanhar o primeiro avião com destino às Bahamas para ir beber livremente da água mágica. A fonte encontra-se numa das quatro ilhotas que o ilusionista acabou de comprar no sul das Bahamas e é portanto propriedade privada. Mas podem talvez chegar lá perto, se estiverem dispostos a investir 300 000 dolares para o aluguer de Musha Cay, um resort de férias numa das ilhotas paradisíacas.
Como soube o prestidigitador em questão que se tratava da fonte da juventude? Diz que folhas mortas que caiam na tal fonte voltam a encher-se de clorofila e de vida e que insetos semi-mortos que toquem na água saem dali a voar. E já contratou biólogos e geólogos para investigar os potenciais efeitos da água em humanos.
Será mais uma das suas ilusões? Uma coisa é certa: com milionários americanos a pagar balúrdios por contratos para serem congelados quando morram, caso os cientistas algum dia consigam inventar meio para ressuscitar e renovescer os mortos, não há-de faltar procura à dita fonte da juventude. Os cifrões a entrar-lhe para a conta é que não serão ilusão. E será que virá um dia para a televisão com a aparência de um puto de quinze anos para nos assegurar de que não é treta?

sexta-feira, agosto 18, 2006

Musa inspiradora
Desde que comecei este blog que me veio o receio de que um dia se vir a silenciar de vez a minha musa inspiradora – exactamente como deve ter acontecido em Hollywood: já esgotadas as sequelas (Rambo I, II, III; Rocky 5+; Querida encolhi/ampliei/voltei a encolher os miúdos; Sózinho em casa/em Nova Iorque, vira o disco e toca o mesmo), de há uns anos para cá só fazem repetidos remakes de filmes já antigos: depois de todos do Agente 007 com o Sean Connery, o King Kong, A Pantera Cor de Rosa, o Homem-Aranha e muitos, muitos mais. O novo Super-Homem estreou recentemente e o Miami Vice estreia hoje. Como seria de calcular já estão a filmar a nova versão do Dallas e quem sabe se não projectam já fazer uma nova versão da Dinastia, dos Cinco ou do Verão Azul?
E porque não? Se foi um sucesso de bilheteira ou de audiências da primeira vez, deve valer a pena voltar a bater no mesmo filão, já que não se pode privar os netos das experiências cinematográficas essenciais dos avós, se bem que com efeitos especiais bem mais à maneira e os actores da predilecção da camada mais jovem. E reciclar só faz bem ao ambiente. Lindos meninos, tão aproveitados e o público a julgar que Hollywood era uma cultura de alto esbanjamento, de usar e deitar fora! Entretanto a miudagem terá dificuldade em perceber que cubículo envidraçado é aquele em que o Clark Kent entra para uma rápida muda de roupa, uma vez que são escassos os adolescentes que já viram uma cabine telefónica nos dias que correm.
O que de certo modo igualmente me preocupa é o que farão quando eventualmente chegarem ao fim do arquivo. Só espero que me poupem a novas versões de filmes de sapateado do Fred Astaire e a musicais, à excepção da Música no Coração, que já é perfeito como é e não necessita de uma segunda via.
Já ficam avisados: se me faltar a inspiração arriscam-se a ver aqui o regresso do dicionário assassino (da língua portuguesa)!

quinta-feira, agosto 17, 2006

Ó gente, o quanto me irritas!...
Confesso que a paciência nunca fez parte do meu modesto rol de virtudes. Mas ultimamente tenho-me apercebido de que há cada vez mais tipos de pessoas que sem esforço me irritam colossalmente:

  • As que à Sexta feira à tarde apesar da fila longa no Multibanco insistem em ver o saldo e levantar dinheiro. Mete cartão - escolhe idioma (opcional) - marca código - marca 'ver saldo' - tira cartão - tira talão. Mete cartão - escolhe idioma (novamente opcional) - marca código - marca 'levantamento' - marca a quantia desejada - tira cartão - tira dinheiro - quer talão? Sim - tira talão - conta dinheiro. E nisto já lá vão vários minutos preciosos de vida!
  • As que reservam toda a ambivalência e incerteza para a ida à padaria: "Bom dia. Queria seis bolas bem cozidas...não, olhe, dê-me antes um pão de forma." "Mais alguma coisa?" "Não...ah...olhe, já agora dois pãezinhos de leite e um croissant." "Simples?" "Sim...não: com queijo e fiambre, se faz favor". E para ajudar à "festa" fazem questão de pagar em trocados: "Quanto é?" "Doze euros e vinte e sete cêntimos". "Dez, onze, doze e dez, quinze, vinte, vinte e um, vinte e dois, vinte e sete. Veja lá se está certo", o que leva a empregada a contar o moedame: "Dez, quinze, vinte, vinte e um, vinte e dois, vinte e sete. Está certo sim."
  • As que não se descalçam à entrada da praia e bombardeiam os demais veraneantes já a secar-se deitados nas toalhas com a areia levantada pelos chinelos.
  • Os automobilistas indecentes: os que vão na brasa e optam por ultrapassagens perigosas. Os que vão a pisar ovos mesmo à minha frente e só para chatear aceleram assim que faço sinal para ultrapassar. Os que vão a falar animadamente ao telemóvel bem colado ao ouvido. E os que se alapam à traseira para pressionar a excesso de velocidade.
  • As que não têm a minima vergonha de deixar lixo por onde quer que passem - donos de cães, fumadores e fumadores donos de cães estão no topo da lista.
  • As que tossem sem pôr a mão à frente da boca. As que cospem para o chão. As que se apressam a entrar no Metro e não deixam primeiro as outras sair. As que são mal educadas para os clientes e claramente não acham que o cliente tem sempre razão. As que param subitamente no passeio sem avisar. E as que se irritam por tudo e por nada.

quarta-feira, agosto 16, 2006

Teimosia de aranha
Há quem me ache muito teimosa. Confesso que gosto de uma boa argumentação, em particular se acho que tenho razão. Mas teimosa? Não mais do que a média, creio. E quem me chama teimosa não conhece a aranha que habita por detrás do espelho direito do meu carro. Todas as manhãs encontro uma teia de aranha bem esticada entre o espelho e a janela, como a pele de uma sexagenária de Hollywood ou uma rede de volleyball. O finíssimo fio de seda que a estica de lado a lado é desfiado em ambas as pontas com cinco-seis ramificações e em cada ponta destas um pontinho de uma substância colante. É uma autêntica obra prima em termos de confecção. Parece-se com as teias que o Homem-Aranha projecta para se movimentar de a para b – terei um super-herói a residir atrás do espelho? Como os aracnídeos são a minha aversão predilecta, todas as manhãs sem dó nem piedade lhe destruo o lar de uma assoalhada com despensa, certamente fiado durante horas, para o voltar a encontrar bem esticado entre o espelho e a janela na manhã seguinte. Esta luta de vontades perpetuar-se-á até uma de nós desistir. Aí é que se vai decidir quem é teimosa.
Epílogo: Hoje também encontrei uma teia de aranha, se bem que menos elaborada, no espelho esquerdo. É impressão minha, ou o meu carro está-se a tornar um condomínio fechado?

terça-feira, agosto 15, 2006

Carta ao editor de um pseudodicionário
Comecei ontem a escrever uma carta ao editor do malfadado “dicionário prático de português”:

Leandro Lara, editor
C/Arnau 19-21
08032 Barcelona
Espanha

Exmo. Sr.
(se começasse por lhe chamar o que realmente penso dele, nomeadamente “sua grandessíssima besta ignorante, analfabeta e certamente académica” não me faria ouvir; daí o coloquial, neutral “exmo. sr.”)
inteirei-me de que tinha sido o editor de um dicionário de português de bolso (chamo-lhe dicionário para não ter de ser ordinária e chamar-lhe o que realmente é, um monte de uma coisa desforme, escura, feia e mal cheirosa) que foi recentemente ofertado ao meu marido. Este, sendo estrangeiro e amante de Portugal, está bastante motivado para aprender a nossa melodiosa língua o mais correctamente possível, o que já de si é difícil, pois como sabe é uma língua tão complexa como é bela. (mas com o seu “dicionário” não irá lá de certeza!) Infelizmente constatei que o dicionário editado por si está repleto de erros ortográficos gravosos de uma capa à outra, o que acho vergonhoso para o tipo de obra que é (ou devia ser). Peço-lhe portanto (por amor de Deus e tudo quanto lhe é sagrado!) que o retire do mercado (e deixe de assassinar o português de vez!) e pelo menos lhe dê uma revisão totalmente exaustiva antes de reconsiderar voltar a publicá-lo (e o melhor mesmo seria que não voltasse!)
Saudações cordiais (se bem que mais me apetecia insultá-lo e dar-lhe um enxerto de porrada, porque é o que merece...)
Vida de praia,
Copenhaga

O que acham do rascunho?

segunda-feira, agosto 14, 2006


Caprichos de vedeta
A Madonna começou há dias a sua nova turné mundial, ”Confessions”. Também vem cá e conheço quem tenha arranjado já bilhetes. Ora, já toda a gente sabe que as estrelas têm caprichos e exigências quando dão concertos: fruta fresca no camarim, água mineral fresca mas não gelada, matraquilhos, champanhe e morangos em Novembro, saída assegurada pelas traseiras e avião privativo para evitar assédios dos fãs. A Madonna, porém, é uma mulher hoje conhecida por hábitos saudáveis, grande espiritualidade, bom gosto e requinte; não como nos anos 80 em que andava de roupa interior a cantar “like a virgin”. Por isso espantou-me o que exigiu para esta turné: um tampo novo de sanita, selado, por estrear, todas as noites em que der espetáculo. O tampo tem para além disso de ser inspeccionado pelos seus técnicos antes de ser montado. E como explicar isso aos japoneses já de si conhecidos pela higiene clínica e absoluta?
Também os media inquiriram sobre desejo tão sui generis. A assistente e porta-voz de Madonna comentou então com um jornalista: “Quem não quereria um tampo novo de sanita onde quer que esteja?”
Hmmm... pois é... não sou propriamente fã de casas de banho públicas, mas por acaso não tinha pensado nisso.
Terá sido um lapso não propor acrescentá-lo à declaração dos direitos humanos?

domingo, agosto 13, 2006

Armadilhas vivas
Recentemente perdi-me numa estufa. Não me perdi no sentido literal de perder a orientação e o rumo e de não saber onde estava; e nem a estufa era tão enorme assim. Mas para mim uma estufa é um mundo tão variado, tão interessante que me prende a atenção e destrai de tudo o mais. Desde plantas exóticas como orquídeas e palmeiras até aos mais comuns fetos, oliveiras, brincos-de-princesa, hortências, gerânios, sardinheiras de côres garridas. E vasos lindos. E utensílios de jardinagem pouco práticos mas muito decorativos.
Venho sempre de lá com o porta-bagagens repleto de plantas. Desta vez não pude deixar de comprar uma pequeníssima planta carnívora, uma dionaea (ou ”armadilha de moscas de Vénus”; creio que “Vénus” se refere à armadilha, não às moscas; em Vénus não deve haver moscas...) verde-alface com muitos “braços” como um polvo e em cada extremidade uma autêntica armadilha, como duas mãos com finos cílios sensores nas palmas, sempre pronta a cerrar-se como duas mãos entrelaçadas ao mínimo movimento de um inseto que lá caia ignorando o perigo. Só se volta a abrir quando feita a digestão. Fico fascinada quando por exemplo uma mosca se aproxima e zás! Fica presa na armadilha e tenta freneticamente libertar-se, só conseguindo assim que a armadilha se feche cada vez mais. E chateio-me se só pousa ao de leve e consegue fugir antes de ser apanhada.
Foi assim que descobri este meu fascínio mórbido. Terei outros sem saber?

sábado, agosto 12, 2006

Cortar ou não cortar, eis a questão – parte 2
Não sei se conhecem aquele sentimento de surpresa depois de uma coisa, que se receara, ter corrido muito mais para além das expectativas e ser praticamente impossível reconhecer qual era afinal o problema inicial. Andei eu a fazer um bicho de sete cabeças? Uma tempestade num copo de água? Foi esse mesmo sentimento de surpresa que tinha ontem quando saí do salão de cabeleireiro com o cabelo leve ao vento.
Dei liberdade à minha cabeleireira, que já me conhece há mais de um ano, para fazer o que achasse que devia fazer. Deu uma coloração profunda mas ligeira; lavou; tratou; secou; escadeou levemente; esticou; alisou; cortou como achou por bem, mantendo o penteado comprido mas mais suave.
Acho que já me tinha esquecido como era. Foi uma experiência bastante intensa para todos os sentidos. Para a visão as garrafas e tubos de côres vivas, os penteados arrojados das cabeleireiras, o artigo e meio que cheguei a ler na revista Elle com óptima fotografia, a cliente com papeis côr de mostarda no cabelo, os espelhos do chão ao teto com as suas molduras de mogno. Para o ouvido a música, a conversa animada com a cabeleireira, as outras conversas no salão, todas elas sobre férias bem passadas ou férias ainda a passar. Para o gosto o chá de frutos, hoje não me apeteceram uvas nem biscoitos. Para o tato a massagem ao coro cabeludo, a lavagem prolongada com água à temperatura ideal, a exfoliação às mãos - um extra para experimentar um produto novo em promoção - as toalhas macias acabadas de sair da secadora a envolver-me o cabelo molhado, o cabelo seco à mão, esticado à escova e alisado a ferro. E para o olfato os odores agradáveis do shampô caro, do novo volumizador que ao mesmo tempo realça o brilho natural do cabelo.
Quantas vezes tenho duas horas e meia só para mim própria em que posso esquecer tudo lá fora e deixar que me encham de mimos e luxos?
Duas horas e meia depois eu era uma nova mulher de mãos e cabelo sedosos, como uma estrela de cinema num anúncio da L’Oreal, “porque eu mereço”, a passear o cabelo de um lado para o outro por essas ruas fora e a contemplar-me nas montras das lojas. Qual era afinal o problema?
Eu até punha uma foto do novo penteado no blog, mas não tenho ainda uma máquina fotográfica digital. Por isso usem a vossa imaginação. Por agora vão ter que se contentar mais uma vez com a foto do meu salão preferido onde passei umas belas horas Sexta à tarde.

sexta-feira, agosto 11, 2006


Jantar fora numa Terça à noite
Terça fomos impelidos pelo impulso da hora a jantar fora. Não tinhamos reservado mesa. E não estávamos à espera da quantidade surpreendente de gente que tinha tido a mesma ideia num dia de semana. Chegados ao restaurante da nossa escolha esperámos que nos viessem indicar uma mesa, como dizia no letreiro à entrada. De preferência do lado de fora para a proveitar o bom tempo. E esperámos. E esperámos. A fome foi gradualmente aumentando. Assim que resolvemos virar costas e procurar outro pouso, o garçon dirigiu-se a nós. Perguntou se também faziamos parte de um grupo de oito pessoas, das quais até estávamos um pouco afastados, e para o qual já estava pronta a mesa. “Não? Então perdão pelo inconveniente. Pensei que sim. Só um momento então”. Dois. Três. Quatro. Lá nos mostrou onde sentar, a terceira mesa num rol de três. Depois foi o esperar pelas ementas. A escolha do comer. E a azáfama habitual de tentar desesperadamente estabelecer contacto visual com o garçon. Com quase trinta graus a água só sabe bem gelada, mas o gelo estava esgotado (?). Mesmo assim conseguiram servi-la bastante fresca, vá lá. Depois foi o esperar pelos pratos. E a fome a aumentar. Se não estivesse já sentada e com tanta larica que devorava logo ali um búfalo, tinha-me levantado e ido embora. Foi então durante a demorada espera que o meu marido teve a genial ideia de desistirmos dos cafés e sobremesas (eu ia desistir mesmo à partida, como sabem), pedir logo a conta e pagar quando trouxessem o comer – para evitar mais tentativas frenéticas de estabelecer contacto visual e mais espera.

Rescaldo
Déjà-vu. Enquanto comiamos sentou-se na primeira mesa um casal português. Contemplavam a ementa e falavam entre si: “ishto cherá bom?” “O que cherá ishto?” Ainda pensei manter-me incógnita. Mas acabei por me compadecer dos beirões que vinham para Copenhaga sem falar uma palavra de inglês e expliquei o que eram os diversos pratos. E é claro que com isto convidei às perguntas do costume: “Está cá de férias ou vive cá? “"E está cá há quanto tempo?" "e gosta de cá estar? Dizem que é tão escuro no Inverno" Não lhes dei oportunidade de perguntarem "e já tem bébés?" Assim que senti aquele olhar inquisitivo sobre mim, esquivei-me, levando o marido atrás.

quinta-feira, agosto 10, 2006

Casamentos em contra-relógio
Uma amiga minha foi recentemente pedida em casamento pelo seu namorado hiper-romântico. Vão casar na próxima Primavera. Mas a julgar pelas páginas de planeamento destas cerimónias na internet, já vão com seis meses de atraso. Sim, que segundo os peritos, um casamento a valer tem que ser planeado pelo menos com ano e meio de antecedência. Senão será praticamente impossível escolher um tema e a côr dominante, as damas de honor não irão a condizer com os lacinhos das flores, e as flores destoarão do vestido de noiva e das ementas, que deveriam de preferência ser feitas à mão pelo casal, ou na pior das hipóteses mandadas fazer profissionalmente tal como os convites e aqueles pequenos papelinhos que indicam, quem se senta onde e ao lado de quem. A decoração do carro nupcial também já estará comprometida, se é que vão conseguir alugar um carro à maneira, senão terão que optar ir de bicicleta para a igreja. Já me esquecia da igreja! Como marcar a data desejada com tão pouca antecedência? E o sítio para o copo de água? Já não vai dar para conseguir aquela banda divertida especializada em casamentos, nem o saxofonista e dois violinistas exímios para tocar o "all you need is love"; o fotógrafo vai ter que ser o primo em segundo grau que tirou um curso de fotografia por correspondência e os DJs à disposição nesta altura já não são dos mais famosos. Mandar abrir uma lista para presentes na(s) loja(s) favorita(s) é uma possibilidade que certamente também já foi à vida. E a viagem de núpcias vai mesmo ter que ser de terceira categoria.
Fiquei a par deste contra-relógio através de uma colega que se vai casar daqui a quinze dias; só se pôs a planear detalhadamente o grande dia há dois meses...
Parabéns e muitas felicidades!

quarta-feira, agosto 09, 2006

Cortar ou não cortar, eis a questão
Depois de amanhã vou à cabeleireira. Já estava marcado há semanas, mas como de costume ainda não sei o que fazer com o meu cabelo indomável, que encaracola selectivamente acima da orelha e em geral é liso e acachapado como um pano molhado, independentemente do modo de secagem. Para mim não há desafio maior, é sempre o mesmo dilema decidir que penteado escolher: curto? Nem pensar! Comprido? Hmmm… acima ou abaixo dos ombros, ou pelos ombros? Escadeado ou direito? Liso? Ondulado? Com risco ao lado ou ao meio? Sobre a franja já foi decidido há muito tempo, não me fica nada bem com esta cara de lua cheia. E desisti da permanente depois dos anos oitenta em que aparentava um cão de água. E madeixas? Com tantas brancas aos trinta e três já justificava talvez uma coloração. Máscara fortificadora capilar?
O problema é que não tenho imaginação nem arrojo e acabo sempre por escolher o mesmo penteado. Lá vejo freneticamente revista atrás de revista para ter umas ideias. Isto seria giro, mas... e se me arrependo? Como se o cabelo não voltasse a crescer e se tratasse de um estado permanente como uma operação plástica. Ou uma escolha de vida ou morte.
Uma vez fui a um cabeleireiro que se mostrou muito perspicaz: ia preparada e dei-lhe instruções minuciosas sobre o que queria, ao que ele retorquiu: “ah, quer exactamente o mesmo, mas cinco centímetros mais curto, é isso?”
Portanto depois de amanhã vai ser o mesmo martírio: vou voltar a ver freneticamente as revistas, pedir a opinião qualificada da cabeleireira, acabando por sair de lá exactamente como entrei, mas sem os tais cinco centímetros.
Ainda tenho dois dias para pensar...

terça-feira, agosto 08, 2006

Vícios
Vício: 1. defeito pelo qual uma pessoa ou uma coisa se afasta do tipo considerado normal, ficando inapto a cumprir determinado fim; 2. hábito profundamente enraizado de acções consideradas moralmente condenáveis; libertinagem; desmoralização; 3. mau hábito; costume condenável; 4.erro contra as regras da arte ou da ciência; 5. propensão irresistível; disposição natural; 6. erro; 7. imperfeição; 8. dependência em relação ao consumo de determinada substância (álcool, tabaco, etc.) (© Porto Editora).

Os seres humanos são propensos a vícios. Desde muito cedo porém que me pude vangloriar de os não ter já que não fumo, não bebo, não me drogo, não rôo as unhas e não aponto, que apontar é feio. Mas uma análise mais objectiva da minha pessoa à luz do que define o vício revelaria certamente que esta postura de ser melhor que os demais não corresponde à verdade. Por curiosidade decidi-me portanto a pôr o orgulho de lado, pôr mãos à obra e vasculhar as minhas profundidades. E nem querem saber o que encontrei!... A minha lista de vicios, se bem que não dos mais prejudiciais, penso eu, ficou mais longa do que esperava:
  • blogar (obviamente!)
  • ver se chegou algo à minha caixa de correio electrónica, quinze vezes por dia
  • ler o blog do Cristiano Ronaldo
  • beber café, vários ao dia, e chá se me apercebi que já ultrapassei por muito a minha dose de café
  • não deixar luzes acesas nem portas abertas quando saio de um local, mesmo que volte brevemente
  • pôr wallpaper do Cristiano Ronaldo no monitor
  • ler a diária do Calvin & Hobbes na página do Público na internet
  • lavar as mãos depois de um aperto de mão, sempre
  • falar do Cristiano Ronaldo sempre que tenho ocasião
  • começar um caderno cuidadosamente com letra bonita e ir abandalhando à medida que vou escrevendo
  • comer iogurtes - podia aliás viver a iogurtes - e café
  • andar com a camisola 17 da selecção, quer durante o Mundial quer depois
  • esferográficas, lápis, lapiseiras, marcadores, enfim tudo quanto seja material escolar
  • ser incapaz de entrar numa loja sem que lá esteja pelo menos um cliente dentro
  • ter várias camisolas 17
  • guardar os bilhetes do cinema
  • bordar as frases com "sempre", "nunca" e outras generalizações grotescas desse género. Sempre
  • não usar as coisas se são novas e bonitas demais, para se manterem novas - somente as guardo e contemplo
  • comprar revistas triviais só por trazerem artigos sobre o Cristiano Ronaldo
  • guardar coisas com imagens de girassóis, morangos ou orquídeas
  • guardar moedas novinhas em folha
  • ver comédias românticas vezes sem conta
  • ter tantos vicios relacionados com o Cristiano Ronaldo.......?

É por estas e por outras que não me dou a autoanálises muitas vezes, nem dou largas à curiosidade!... Ora tratando-se como se trata de hábitos profundamente enraizados e propensões irresistíveis, para quê então descobri-los apenas para ficar frustrada ou demasiado ciente de mim própria uma vez que certamente são difíceis de alterar? Posso cortar no café. Mas não consigo abdicar da lavagem de mãos, dos iogurtes e do Cristiano Ronaldo!

segunda-feira, agosto 07, 2006

Quem conta um conto acrescenta um ponto
Costumo ser bastante descontraída com o que ingiro fazendo uma dieta relativamente equilibrada, sem grandes sacrifícios. Mas fazia-me bem à auto-estima perder uns quilitos ainda este Verão. Decidi portanto que amanhã vou começar a fazer dieta. Já me aconselhei com os peritos - neste caso as peritas, como é óbvio - e, inspirada pelos seus bons resultados, escolhi uma daquelas dietas que consiste em pesar as porções correspondentes a um x número de pontos. Também já calculei que com a altura e peso que tenho actualmente, as refeições que faço durante o dia não deverão ultrapassar um total de 18 pontos. Será muito ou passarei fomeca? A única maneira de descobrir foi consultar uma lista bem longa e elaborada que traduz os diversos alimentos em termos de pontos.
Só para dar uma ideia: uma tosta 1 ponto, uma fatia de queijo 1 ponto, duas colheres de mel ½ ponto, um cappucino 2 pontos, um sumo 1 ponto, um iogurte de fruta magro 2 pontos, um copo de leite magro 1 ponto, cinco azeitonas 1 ponto, uma posta de salmão fresco 4 pontos, uma perna de frango sem pele 2½ pontos (com a pele 4½), um bife de vitela 3½, noventa gramas de pasta 2 pontos, uma tacinha de arroz doce 4½-5, quinze cerejas ou dez bagos de uva 1 ponto, um copo de vinho 2 pontos. Para quem não gosta nada de fazer contas o desafio será duplo. Vegetais como a cenoura, os brócolos e as alfaces não contam, podem comer-se à vontade para além dos pontos. Em contrapartida três peças de fruta é o limite diário devido ao seu teor elevado de hidratos de carbono.
Tenho a clara impressão que vou comer muita cenoura, brócolos e alface durante os próximos tempos.
Adeus queijinhos, adeus azeitonas a granel, adeus fruta ad libitum, adeus vinho.
Mas reservarei as despedidas para amanhã.
Desejem-me boa sorte que bem vou precisar!

domingo, agosto 06, 2006

Dicionário prático de lingua portuguesa
Ofereceram recentemente ao meu marido um dicionário de português. Mais precisamente um "dicionário prático de português". 'Excelente ideia', pensei cá para mim, 'uma boa forma de lhe expandir o vocabulário com palavras de uso corrente'. Pensava eu...por curiosidade dei-lhe uma vista de olhos. Fiquei atónita. Página após página deparei-me com palavras que nem sequer eu, portuguesa, nascida e criada em Portugal por pai e mãe portugueses, conhecia ou jamais tinha ouvido. Começando pelo a: abalizar, abanicar, abluir, aboletar, acampto, afainar-se, agostado e por aí em diante. Isto ainda seria o menos, pois não presumo conhecer todas as palavras de um idioma tão vasto como o português. Mas num dicionário apinhado de gralhas?! Como "femenino", "facer" (em vez de "fazer"), "doensa", "camino", "efecto", "antapassado" (será um antepassado residente nas antas?) "dictadura", "au" (não de dôr, mas em vez de "ao"), "famílea", "acrecentar", "objeto", "apoyo", "feo" (em vez de "feio"), "padecimiento", "amigadalas" (quererão dizer as amígdalas amigas?), "oscuro". E vejam só a definição de "abarrotar": "Atestar, empanturrar, cobrir de barrotes" (?) Sabem o que é "aceleirar"? Supostamente um aumento de velocidade. E ampliar? Adivinharam!: é tornar amplio. Foi ao ler a nota introdutória, também ela com vários erros ortográficos, que comecei a perceber que isto não era afinal um dicionário comum. Cito-a quase na sua íntegra pela sua qualidade rara de simultaneamente se adequar à venda de automóveis em segunda mão ou qualquer produto da TV-shop:
"De antemão é nosso dever advertir que este dicionário não se destina a eruditos, universitários, escritores, dientistas ou pessoas que exerçam prosissões liberais altamente qualificadas. Pensamos porém, que será de grande utilidade para todos aqueles que pretendam enriquecer o seu vocabulario e procurar a definição adequada das palavras que, apesar do seu uso frequente em obras literárias e artigos jornalísticos, escapam normalmente ao conhecimento dos leitores que apenas intuem o seu significado pelo contexto geral da frase, escrita ou falada. Por outro lado , omitimos na presente obra os vocábulos de emprego mais generalizado, cuja inserção seria inútil, uma vez que são de uso habitual ea sua definição está ao alcance de todos. Assim sendo, os substantivos, verbos e adjectivos de uso corrente na linguagem coloquial ou escrita comuns, não se encontram neste livro. No entanto, aparecem as palavras de uso menos frequente, cujo significado pode ser desconhecido ao leitor normal. [...] Este dicionário, de fácil manuseio, permitirá aos que consultem as suas páginas melhorar os seus conhecimentos linguïsticos de forma cómoda e amena, uma vez que a sua manipulação não apresenta qualquer dificuldade. Além disso, o seu tamanho está estudado para que as pessoas possam levá-lo consigo, numa carteira ou mesmo no bolso, permitindo que seja consultado no momento exacto"
É óbvio que este particular dicionário de bolso não se destina a pessoas normais, eruditos, escritores, dientistas ou pessoas que exerçam prosissões liberais altamente qualificadas. Aliás nem a eles nem a ninguém minimamente inteligente que se queira expressar na língua portuguesa de uma forma correcta e qualificada. Mas como será possível publicar um dicionário tão manhoso? O mistério desvendou-se por completo quando ao averiguar a sua origem potencialmente duvidosa me dei conta de que este "prático" dicionário era editado em Barcelona... lá voltam os espanhóis perfidamente a sabotar-nos a vida!... Claro está que nem cheguei ao b. Desisti. Guardei o "dicionário" bem no fundo de uma gaveta bem funda, debaixo de vários "objetos" mais vistosos. E vou estar de atalaia - não há-de ser deste vocabulário que o meu marido irá assimilar, ou seria desastroso. Se não fosse um livro - que livros não se deitam fora - teria ido com destino ao caixote do lixo. Talvez devesse consultar um dicionário para ver a definição correcta da palavra "livro"...

sábado, agosto 05, 2006

Há varandas e há marquises
Adoro a minha varanda! Não é muito grande mas o suficientemente ampla e é de momento o meu favorito espaço de lazer em toda a casa. É aqui que leio, escrevo, matuto sobre a vida, adormeço, vejo o pôr do sol. Tomo aqui o pequeno almoço ao Domingo. Apanho sol, descanso, bebo ice tea, espanto as gaivotas madrugadoras entre Abril e Outubro. Só aqui tenho duas roseiras, um vaso de ervas aromáticas e um de margaridas. E duas indispensáveis esperquiçadeiras. De Verão também cá seco a roupa e de Inverno contemplo a neve que uma vez ou outra aqui se amontoa, cobrindo os vasos por completo.

Na Dinamarca não é muito habitual ter varanda e quem as tem desfruta-as ao máximo: o churrasco faz horas extraordinárias, fazem-se almoços, jantares (casamentos e batizados, que saiba, ainda não), bebe-se cerveja e rosé fresquinho e conversa-se até às tantas, também com os vizinhos nas suas varandas a jantar e a conversar.
Quando eu era miúda também tinhamos varanda. Gostava de lá brincar, fazer tendas com os cobertores e, nos meus momentos mais marotos, molhar os transiuntes sem ser vista. Vieram os anos oitenta e tornou-se moderno fechar as varandas, envidraça-las, torná-las nas ditas marquises. Os meus pais seguiram a tendência e a ex-varanda actualmente marquise foi-se enchendo de coisas e móveis e a enorme gaiola dos piriquitos e foi-se transformando numa segunda arrecadação com espaço ínfimo para brincadeiras.
Como desfruto tanto da minha varanda hoje acho cada vez mais difícil compreender a razão de ser da marquise portuguesa. Será para proteger do sol? Para esse efeito bastaria certamente um chapéu de sol. Para ganhar mais uma assoalhada para acolher a família já grande no tempo em que o planeamento familiar era tão comum como i lince da Malcata? Ou talvez para não destoar do vizinho que ainda hoje não sabe ao certo porque deixou a marquise substituir a varanda? Só sei que a moda pegou de tal maneira, que muitas casas novas em Portugal hoje em dia são tão práticas que até já vêm com marquise.

sexta-feira, agosto 04, 2006

Chamem a polícia ô, ô, ô
Há quem diga que a polícia nunca está no sítio certo na hora certa. Por acaso discordo. Anteontem nos vinte e poucos minutos que levo do trabalho a casa vi dois polícias exactamente no sítio certo e na hora certa: o primeiro parou o seu próprio veículo e pôs as luzes a farolar (não sei como se chamam as luzes no topo de uma viatura de polícia, mas a mim parecem-me mini-faróis, daí o "farolar". Quem não tem cão, caça com gato, não é verdade?). Isto para ajudar um cidadão a empurrar o carro, que de repente se foi a baixo e não queria voltar a pegar, da via pública. Nunca tal tinha visto - um membro da força policial numa acção em que ninguém tinha cometido um delito, à exceção talvez do mecânico do pobre automobilista que nem sequer estava presente na cena deste não-crime. E o segundo a mandar parar um condutor em excesso de velocidade, que a certa altura me ultrapassou à maluca, não aparentava ter mais de quinze anos e cuja matricula do carro estava presa com fita gomada ao vidro de trás. O sr. guarda deu-lhe certamente um raspanete sobre o código da estrada e coisa e tal e é muito provável que o tenha mandado soprar no balão e lhe tenha passado uma multa. Mas deixou-o prosseguir, pois o vilão voltou a ultrapassar-me, o que demonstra que pelo menos era maior de idade e afinal tinha carta de condução.
Felizmente não passou nenhum polícia quando tive de entrar numa ruela em contramão para estacionar e ir fazer uma compra rápida...nem quando me vi a passar já no amarelo duas vezes seguidas por estar atrasada (que vergonha, eu bem sei. Não volto a fazê-lo!). Nessas ocasiões a polícia também estava precisamente no sítio certo à hora certa, bem longe da cena do crime.

quinta-feira, agosto 03, 2006

+ ???
Se a falar é que a gente se entende, vou ali e já venho!
É rara a vez que veja um filme traduzido e que não me arrepie com os erros fatais de tradução que acabam por confundir até o significado das mais simples frases. Uma das minhas amigas fez traduções durante uma larga temporada e sei portanto que é uma tarefa já de si difícil que me atemoriza e que admiro pelos desafios e dilemas que constantemente se põem. É que todos os idiomas têm expressões caricatas, traiçoeiras e, convenhamos, praticamente impossiveis de traduzir. O português, claro, não é excepção. Toda a gente sabe intuitivamente o que é por exemplo um carapau de corrida, mas como traduzi-lo? Um exercício ainda mais divertido é fazer a "tradução" gráfica: um peixe com rodinhas? Ou de sapatilhas nos pés, que não tem, numa pista olímpica à espera do tiro de partida? E como traduzir inexistentes parentescos como compadre e comadre? E pêro? Não é nem maçã nem pêra, pois não? Já para não falar de um clássico, saudades, que sempre se postula não existir nem se sentir em mais lado nenhum. Numa ida ao café sei explicar o que são caracóis, mas e tremoços ou torresmos? É pá, é do arco da velha! Só me saem é duques! Traduzir é fácil, qual carapuça? Quem inventará expressões aparentemente tão absurdas? E a propósito de quê?
Da próxima vez que começar a arrepiar-me com a tradução de outrém, vou tentar lembrar-me que tenho um idioma de expressões intraduzíveis; talvez me dê mais compaixão por quem trabalha.
Bem, agora vou tentar passar pelas brasas que já não posso com uma gata pelo rabo...